O Motivo
Já faz alguns anos que pesquiso a obra de Ramón Ayala, grande
compositor, poeta, escritor, pintor e filósofo nascido em “Missiones”
Argentina, mais precisamente no povoado de “Garupá” em “Posadas” este grande artista
faleceu em Dezembro de 2023.
Homem de origem indígena da etnia Guarany, tinha um vasto
conhecimento relacionado à natureza e trazia consigo uma visão harmoniosa do
ser humano com o meio onde vive.
Me cativou com sua forma de entender o mundo e a vida em si.
Desde então, chamo esta forma de manifestação de Filosofia
Guaranítica, sendo a definição mais próxima que encontrei para denominar
esta relação com o universo.
Por ocasião de uma entrevista em um programa chamado “Encuentro
En El Estúdio”, lhe foi feita a seguinte pergunta; O por que, da sua obra
ter uma conexão tão forte com a terra onde havia nascido?
A resposta me encantou, disse ele: “Na composição do
sangue humano há elementos como, zico, ferro, cobre, manganês, silício, cobalto
e outros elementos encontrados no solo, ou seja, somos terra com pernas braços
e um cérebro, mas a terra não fala, por isso devemos nos expressar por ela,
somos nós a voz da terra em que nascemos”
Em outra ocasião ouvi uma definição fantástica, uma metáfora sobre
renascer. Falou assim: “Não há fim mais nobre para uma árvore que ser um
instrumento musical, pois assim trará em seu corpo as expressões mais lindas,
conectando sentimentos humanos a ventos,
caminhos, amor, saudade e paisagem, tudo em forma de vibrações, matéria morta
renascendo em forma de música.”
Estes são apenas dois exemplos, para situar sobre a obra de
Don Rámon Ayala, pois esta é recheada de poesia, filosofia, conexão e harmonia
com a natureza.
Suas composições musicais foram gravadas por grandes artistas mundo
a fora, entre elas (as composições) estão, “Posadeña Linda, El Mensu, El Cosechero,
Meu Pequeno Amor” entre tantas outras.
Foi a partir daí comecei a considerar a possibilidade de
viajar de motocicleta à “Posadas” numa tentativa de entender melhor esta ligação
quase umbilical deste homem com a terra que onde nasceu.
A viagem
No dia 10/12/2024, saí
de Guaíba pela manhã em direção à região noroeste do RS, mais precisamente
Porto Xavier, pois iria atravessar na balsa o rio Uruguai para San Javier.
Ainda pela manhã antes de chegar em soledade, um acidente com
um caminhão que transportava combustíveis bloqueou a BR 386, voltei alguns kms
e almocei em um restaurante da região.
Logo após segui novamente e constatei que a rodovia
continuava sem tráfego por razão do acidente.
|
BR 386 bloqueada |
Passado umas quatro horas e nada, tudo parado, até que uma
funcionária da concessionária que administra aquela via me indicou um desvio,
seriam em torno de dez kms para sair após o bloqueio, e assim fiz.
A pequena e apavorante estrada destruída pela enchente quase
não permitia trafegar, um verdadeiro caos, levei mais de hora para percorrer o
trajeto, pedras soltas pontudas e erosão era a cobertura principal do judiado
caminho, o restante eram crateras e mais crateras.
Já no outro lado, são e salvo segui adiante, entrei a
esquerda na RS 332, em direção a Cruz
Alta, onde fiquei aquela noite, num hotel chamado “Califórnia”.
Na manhã seguinte segui para Porto Xavier, cheguei por volta
de 11:30 antes de embarcar, apresentei os documentos da moto, RG e carta verde,
no outro lado a mesma coisa.
|
A Balsa Brasil Agentina em Porto Xavier |
|
Travessia de Porto Xavier para "San Javier" |
Uma das coisas que percebi nesta região, do lado brasileiro
monoculturas de soja e milho, no lado argentino erva mate, ou seja, formas
diferentes de cultivo da terra, sendo que a erva mate é uma planta nativa da
região, nos dois lados, mas o lado argentino é onde há um cultivo de erva
extremamente maior. (imagens no meu canal: You Tube/ Conexão Visceral)
|
Cultivo da erva mate em Missiones Argentina |
Observando o motivo disso, entendi que na região de “Missiones”
no território argentino há uma preponderância de pessoas de origem indígena, e
com certeza a cultura Guarany tem uma relação bem mais harmoniosa com o meio
ambiente.
Não se trata de achar certo ou errado, mas apenas de entender as
formas de relacionamento com a terra em diferentes culturas.Não se trata de certo ou errado mas apenas de entender as
formas de relacionar-se com a terra em diferentes culturas.
Segui adiante, passando por “Los Galpones”, “Leandro Além”,
“Santa Ana”, “Candelária”, “Garupá” e finalmente
“Posadas”, uma linda cidade, com uma população em torno de 300.000 habitantes,
com uma orla invejável.
Ao contrário de “San Javier” que é pequena e desorganizada,
“Posadas” é grande limpa e organizada, com uma linda vista para o rio Paraná e
para “Encarnación” no lado Paraguaio.
Em “Posadas” fiquei no hotel “Vanderloo” “En la Calle
Barrufaldi” um bom custo benefício, muito parecido com o que se acha aqui no
RS.
|
Hotel Em "Posadas"
|
No outro dia, segui na direção sul, para “Santo Tomé” onde
iria ficar em São Borja, já no RS, e assim foi, antes de atravessar a ponte
para o lado brasileiro cheguei na cidade de “Santo Tomé” para conhecer.
Pequena e pobre, mas com um diferencial, conta com uma
faculdade de medicina, onde há brasileiros estudando.
|
Faculdade de medicina em "Santo Tomé"
|
Em São Borja fiquei no Village Hotel, bem no centro da
cidade, um ótimo custo benefício, simples e bem organizado, ótimo café da manhã,
a gerente uma Sra. de origem palestina muito educada e de conversa agradável,
me falou das suas raízes, história da família e do acolhimento dos brasileiros
quando chegaram aqui.Pra mim isso é muito importante, são experiências vividas e
compartilhadas, uma boa oportunidade de entender a cultura e o “modus vivendi”
das etnias que foram recebidas pelo povo do RS.
No outro dia segui em direção à Uruguaiana, mas antes passei
por Itaqui, queria muito conhecer este lugar que é o considerado ponto mais
distante de Porto Alegre dentro do estado do RS.
Ao chegar à ponte do rio Ibicuí, esta estava interditada
momentaneamente para consertos.
Esperei por cerca de uma hora para poder seguir.
|
Ponte sobre o rio Ibicuí |
A ponte tem sentido único e é regulada por um semáforo que
libera o trânsito na forma “pare e siga”, o estado de conservação é precário,
durante o cruzamento ouvia os estalos da estrutura pressionada pelo peso dos
caminhões.
Durante a tarde cheguei à Uruguaiana, com receio de não
conseguir hospedagem, pois seria a noite final da “Califórnia Da Canção”, mas
no primeiro Hotel que cheguei consegui acomodação, este se chama “Roll in” na
Av. Flores da cunha, distante apenas duas quadras do palco da Califórnia da
canção.
|
Maurício Barcellos, na 46ª Califórnia Da Canção |
Sempre quis assistir uma edição da Califórnia ao vivo, mas
nunca imaginei que seria assim, durante uma destas viagens que faço sempre aos
finais de ano.
No Domingo pela manhã segui passando por Alegrete, Rosário e
parei em São Gabriel, o tempo havia fechado por ocasião do ciclone sub-
tropical Biguá, ventos fortes, nuvens negras, decidi então ficar em São
Gabriel.
Me hospedei em um hotel bem próximo da BR 290, numa via de
acesso à cidade.
Ótimo custo benefício e boas acomodações.
|
Hotel dos viajantes, São Gabriel
|
Na segunda feira, segui em frente, o tempo estava duvidoso,
momentos de abertura de sol e outros muito fechados.Consegui chegar até Pântano Grande sem me molhar, mas depois
peguei chuva forte até perto de Charqueadas, mas logo o tempo abriu.
Cheguei em Guaíba no final da tarde da segunda feira dia
16/12/2024.
A Chopper Road, mais uma vez me levou e trouxe sem nenhum
problema, como eu sempre falo, uma motocicleta extremamente confiável.
Este então um breve resumo desta viagem em que tudo ocorreu
como o planejado.
Mais uma experiência vivida, caminhos percorridos,
conhecimento adquirido.
Abaixo algumas fotos aleatórias desta viagem.
Eu (a esquerda) ao lado da cabeça de um Surubí, pescado no Rio Uruguai
Dourado do rio Uruguai
|
Surubí |
|
Monumento ao Jaime Caetano Braun, São Luis Gonzaga |
Museu Getulio Vargas, São Borja
|
Monumento a "Andrezito Guacurarí" "Santo Tomé" Argentina |
|
Museu dos Quatro troncos Missioneiros, São Luis Gonzaga |